quinta-feira, março 29, 2007

De que cultura estamos falando?

O Masp não é um caso isolado. Este é o retrato da maior parte das instituições culturais brasileiras e mostra a falência de um sistema que não investe na criação e propagação de uma atitude cultural. Aqui, entende-se atitude cultural como uma prática corrente e espontânea do desenvolvimento do ser, tomando a cultura como um valor intrínseco ao ser humano, que permeia todos os aspectos de sua vida.

Para atuar como um ser social pleno, o homem precisa de subsídios que permitam a comunicação total e irrestrita; precisa expandir constantemente seu repertório. Nesse sentido, o difícil acesso ao bem cultural, resultado de uma cruel desigualdade sócio-econômica, limita as possibilidades de atuação do indivíduo. Mas é preciso lembrar também que a cultura exerce uma poderosa força motriz sobre esse homem, capaz de levá-lo a criar mesmo em condições adversas, a encontrar e estabelecer novos padrões de comunicação e sensibilidade estética.

Quando falamos das dificuldades do acesso à cultura é preciso ter em mente que todo homem traz consigo um potencial criativo e desenvolve formas de cultura diversas, segundo sua realidade – fatores internos e externos. Essa cultura a que tanto nos referimos não pode ser vinculada apenas ao seu aspecto global, a cultura, digamos, oficial. A discussão sobre a democratização do acesso deve contemplar a criação regional, tradicional, tão generosa e aberta a contribuições. Nomear e classificar a cultura pressupõe o empobrecimento e a disseminação de estigmas.

Por isso, além de buscar caminhos para o desenvolvimento do potencial criativo, é preciso integrar suas diversas formas de expressão. E o investimento em uma educação humanizada deveria ser o primeiro passo para a concretização de uma política sócio-cultural consistente e verdadeira.

domingo, março 11, 2007

Masp 2 - A dura realidade dos museus brasileiros

Achei o Masp largado às moscas. Essa é a verdade.

Fiquei impressionada com a desorganização, o vaivém sem nenhum foco dos seguranças das salas, que aliás passam todo o tempo reparando nos visitantes e fazendo piadinhas.

E a curadoria? Meu Deus, como ninguém reparou que cada tabuleta explicativa tem sua própria norma, padrão?!

A grafia dos nomes dos artistas, por exemplo, parece ter sido concebida à galega. Em determinada parede um quadro é identificado como sendo de Edouard Vuillard*; outro, bem ao lado desse, na mesma parede, aparece como sendo de Edouard Vuillar. Pode até parecer um detalhe insignificante, um "d" a mais, um "d" a menos... pode até parecer que eu é que sou purista. Mas eu sou jornalista e sei a importância de transmitir uma informação com correção, ainda mais quando se trata de um centro de cultura representativo. Não há, ou não deveria haver, espaço para esse tipo de erro.

Mas eu trabalhei um tempo no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio. Sei exatamente como funcionam os bastidores de uma instituição como essa. Funcionários que trabalhavam na saúde, remanejados para a curadoria, sem o menor conhecimento sobre arte, estética... Despreparados e sem a menor disponibilidade para aprender. Querendo apenas bater o ponto, preencher e seguir a papelada da burocracia e sair às 18h.

Ainda assim, conheci gente apaixonada por seu trabalho, em busca de conhecimento e de alçar a arte a patamares mais elevados, ainda que dentro de uma estrutura de trabalho viciada. É nessas pessoas que eu acredito.


*Já que eu citei o pintor, não dá para deixar passar em branco. A tela "A princesa bibesco" é linda, singela, feminina, lírica. Enfim, fiquei imaginando na parede do meu escritório.

Masp - esperava mais

Fui visitar um cliente na Avenida Paulista, bem em frente ao Masp. A reunião foi relativamente rápida e às 15h30 de uma sexta-feira eu já estava liberada. Não pensei duas vezes. Atravessei a rua e, depois de um ano e nove meses de São Paulo, finalmente fui conhecer o Masp - o lado bom de ser dono do próprio nariz... e do trabalho também.

Só pela arquitetura da Lina Bo Bardi e por todos os anos em que quis conhecer o museu, já teria valido. Fui sem nenhuma expectativa com relação às exposições, com a mente e os sentidos abertos. Só isso. E dei de cara com um Boesch, um Van Gogh, um Degas e, um dos meus preferidos, um Modigliani.


Fora os grandes pintores - como se isso fosse pouco -, fiquei bastante decepcionada. Ao atravessar a Paulista, já se vê o cenário, e ele não é nada bonito. O que deveria ser um sólido vazio, quase existencial, um rasgo na paisagem urbana, destaque do projeto de Bo Bardi, se tornou um espaço ocupado... Grupos de pivetes e mendigos fizeram do vão criado por Bardi um ponto de encontro em pleno centro financeiro e cultural de São Paulo. É triste de ver. Mais de uma dezena de moradores de rua ocupando um espaço que não deveria ser ocupado e, ao mesmo tempo, impedido de ocupar um espaço que deveria ser desfrutado, o próprio museu. A entrada custa R$15.


Como é do meu feitio, puxei papo com o porteiro do prédio e o segurança. Acostumados com a movimentação da vizinhança, eles me contaram que tinha até pouca gente, "sexta-feira, sabe como é". Pelo o que entendi, o Masp virou abrigo para a população de rua das redondezas e ainda serve de QG para os moleques que assaltam os passantes quando cai a noite, "eles vão certeiros nos engravatados", diz o segurança. i r o n i a